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Última modificação junho 03, 2025

Senk, a trajetória de um artista fiel às suas raízes

Em entrevista exclusiva, o pintor figurativo Fabiano Senk fala de sua trajetória nas artes e dos planos futuros

Uma das obras de Senk, que foi exposta na SP Arte em 2023. | Foto: Reprodução

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    Fabiano Senk, pintor figurativo nascido em São Mateus, zona leste de São Paulo, transformou o desenho e o graffiti em uma poderosa forma de expressão e identidade. Seu primeiro contato com a arte foi através da música, mas foi no desenho e, depois, na pintura, que encontrou uma maneira profunda de se comunicar com o mundo.

    Formado em Publicidade e Propaganda, Senk abandonou a área em 2014 para se dedicar exclusivamente à arte. Desde então, construiu um trabalho marcado pelo amadurecimento técnico e pela fidelidade a um estilo próprio, com forte influência do surrealismo e das memórias do sertão mineiro, especialmente do Vale do Jequitinhonha, onde viveu seu avô.

    Senk trabalha com temas ligados à vida simples do interior, à espiritualidade e à cultura brasileira. Busca levar sua arte e sua mensagem a novos públicos e territórios, valorizando as origens e mostrando a beleza e a força de um Brasil muitas vezes invisível nas grandes narrativas culturais.

    Em entrevista ao Viva a Cidade, o artista conta um pouco sobre sua trajetória e faz planos para o futuro.

    Pintura “Sem título” (2023). | Foto: Reprodução

    Como você começou sua trajetória na arte? Houve algum momento decisivo que direcionou sua carreira como artista?

    Comecei com a música, acho que foi a primeira forma de arte com que tive contato. Depois, encontrei no desenho a forma de me comunicar com o mundo. Desde então, essa é a forma de expressar todos os meus sentimentos mais profundos. Com 15 anos, fiz meu primeiro grafitti na parede. Ali, minha mente explodiu; achei algo que me deixava anestesiado de todos os meus problemas enquanto o fazia. Sempre levei como hobby, até que, em 2014, após me formar em Publicidade e Propaganda, larguei tudo e decidi viver do que eu mais gostava de fazer: pintar.

    Quais foram os principais desafios que você enfrentou ao longo do seu percurso artístico?

    Primeiramente, foi entender que viver em um tempo diferente do que a sociedade diz ser o correto não está errado. O artista vive com seu relógio próprio. No meu caso, a inspiração não vem na hora do almoço e pinto até a hora de bater o cartão; ela vem e preciso, de fato, colocá-la para fora — é visceral. Talvez, nessa mesma hora, meus amigos estejam indo dormir para acordar às 6h e ir trabalhar, hora essa em que talvez eu esteja indo pra cama descansar.

    Obviamente, no país em que vivemos, passamos por diversas outras dificuldades, principalmente onde a cultura nos é negada às margens da sociedade. A falta de entendimento nos cria estranhezas e, então, ocasiona a falta de interesse em entender o profundo que se encontra em uma obra de arte. Consequentemente, a superficialidade ganha forma e o valor das coisas se transforma. “Ver” valor em um iPhone, em nosso país, é muito mais fácil aos olhos da sociedade do que em uma obra de arte, que não terá seu prazo de validade vencido em dois anos. Mas o mercado vem mudando, e vejo um crescimento exponencial em novos colecionadores com idade entre 25 a 40 anos, com uma cabeça mais aberta para esse reconhecimento.

    Imagem completa da obra que abre essa entrevista. | Foto: Reprodução

    Você poderia nos contar um pouco sobre o seu processo criativo? Como nasce uma obra sua, desde a ideia até a finalização?

    Meu trabalho tem inspirações fraternais. Começo sempre com uma inspiração, lembrança de algo que já vivenciei ou até mesmo uma história que ouvi e, então, parto majoritariamente para a escrita e descrevo o que quero passar com a imagem. Assim, enquanto escrevo, minha cabeça automaticamente já se inicia em um processo de criação de imagem e, como um álbum de fotos em nossos celulares, vou passando para o lado até chegar em algo que de fato se encaixe com a escrita.

    Quais temas ou conceitos você costuma explorar nas suas pinturas? Há algum que seja mais recorrente ou que tenha um significado especial para você?

    Meu conceito é baseado em meu avô paterno, garimpeiro e criador de gado no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Minhas inspirações vêm da vida sertaneja e da simplicidade da felicidade que há nesses locais em nosso país. Atrelado a isso, uso o surrealismo para explorar ainda mais este universo pictórico e cheio de vida.

    Como você enxerga a evolução do seu trabalho ao longo dos anos? Houve mudanças de estilo ou de abordagem?

    Não vejo mudanças no estilo, acho que houve um amadurecimento na fala e, principalmente, na técnica. A vida no ateliê nos proporciona experimentações diárias que nos levam para lugares completamente inexplorados antes. Supostos erros podem, de fato, se transformar em algo novo. Passei da pintura para a escultura e foi mágico ver as personagens que antes habitavam somente em minha cabeça de forma “viva”; agora é tangível e habita no mesmo espaço que eu. Acho que me levou para um novo lugar em meu trabalho.

    Quais trabalhos ou acontecimentos marcaram sua carreira até aqui? Algum projeto que tenha sido especialmente importante? Existe alguma obra sua que tenha um significado especial ou que represente um marco na sua trajetória?

    Minha primeira individual fora do país foi muito marcante. Ver meu trabalho exposto em Nova Iorque, em uma das principais galerias de street art do país (Chase Contemporary), me deixou anestesiado ao ponto de entender o que de fato havia acontecido apenas tempo depois. No dia, pensava apenas em executar tudo corretamente e fazer dar certo. Mal sabia eu que já havia dado. Naquele mesmo dia, conheci alguns dos artistas que mais me inspiraram na vida. Foi muito intenso e abriu minha mente para o mercado mundial; me fez sair dos limites territoriais que existiam em minha cabeça para o mercado de arte. Para alguém que começou seus primeiros traços em São Mateus, um dos bairros mais perigosos da capital paulista, e nunca idealizou onde aquilo poderia levá-lo, foi muito importante — não só pela carreira quanto na vida pessoal.

    Tela “No chão de terra batido, a brincar com meus amigos” (2024). | Foto: Reprodução

    Quais são seus principais objetivos ou sonhos para o futuro na sua carreira artística?

    Quero levar meu trabalho e minha fala para o máximo de pessoas e lugares possíveis. Tenho muito a dizer e levar para o mundo, fazer com que as pessoas possam conhecer um pouco de nossa cultura e nossa crença, que é linda.

    Que conselho você daria para jovens artistas que estão começando agora?

    Façam e façam repetitivamente, botem para fora, se expressem pelo que são, digam o que querem dizer sem medo de qual parede isso possa rebater. Só assim saberá, de fato, quem você é, os lugares em que te cabem e, o mais importante, os que não cabem. O mercado é muito grande e existem muitas formas de atuar. Entender qual é a nossa é muito importante para direcionar corretamente o futuro de nossas carreiras.

    Fabiano Senk | Foto: Acervo Pessoal

    Quais projetos ou novidades podemos esperar de você?

    Desejo explorar mais as formas da escultura, pois me senti muito bem criando e é algo que quero ter mais como ponto de estudo. Trazer a figura humana em formatos mais surrealistas e com representatividade brasileira — aqui talvez pouco explorada nesse formato — e, em breve, uma individual em São Paulo para explorar com maior amplitude todas as formas que permeiam minha produção artística.

     

    Stefany Leandro

    45 publicações

    Stefany Leandro é jornalista e editora-chefe do Viva a Cidade.