Emerge uma lógica que não é mais negocial, de reconhecer o outro, que vira alguém que tem que ser excluído. Daí a força que a lógica do condomínio tem nesse momento. Temos que pôr para fora, “limpar”, purificar. Um entendimento da catarse grega, nós, nossa família, nosso Sul, os brancos, heterossexuais; esses outros, pra fora do muro. (Christian Dunker)
Eu tinha vergonha das minhas mãos, dos meus pés, não tirava a camisa na frente de ninguém. No momento que eu fiz uma máscara e cobri a minha cara… eu encontrei uma coragem que eu jamais imaginava que eu tivesse dentro de mim. Foi libertador. (Ney Matogrosso)
Nas duas últimas décadas, em cidades tão diversas como São Paulo, Los Angeles, Johannesburgo, Buenos Aires, Budapeste, Cidade do México e Miami, diferentes grupos sociais, especialmente das classes mais altas, têm usado o medo da violência e do crime para justificar tanto novas tecnologias de exclusão social quanto sua retirada dos bairros tradicionais dessas cidades. (Teresa Caldeira)
O compositor e dramaturgo Dan Nakagawa, que figura entre os novos diretores da cena teatral paulistana atual, estreou em 2019 o terceiro espetáculo de sua carreira, O Aniversário de Jean Lucca, definido por ele mesmo como um “quase” musical do Teatro do Absurdo. Agora, a montagem ganha uma nova temporada no Complexo Cultural Funarte SP, entre os dias 11 de março e 2 de abril, com apresentações aos sábados, às 21h, e aos domingos, às 19h.
Com forte influência da dramaturgia de Samuel Beckett, Matéi Visniec e Eugène Ionesco, a peça narra os preparativos da festa de aniversário do menino Jean Lucca, filho único de um casal que mora em um luxuoso condomínio nos arredores de São Paulo. Essa criança nunca é vista na peça e sobre ela pouco se sabe, nem mesmo a sua idade ou aparência física. Assim a presença dele se faz pela sua constante ausência.
O enredo se passa durante o fragmento de tempo correspondente aos preparativos da festa até seu início. Nesse ínterim, a Babá e todas as pessoas que vão chegando na casa-bolha dessa família se mostram uma ameaça na vida desse casal, gerando ora uma paranoia excessiva, ora uma profunda apatia. A encenação fala sobre os muros visíveis e invisíveis, físicos e subjetivos que nos cercam, gerando incômodo frente a marginalização, segregação, apatia social, indiferença e a paranoia.
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O texto nasce em consonância com estudos do psicanalista e professor paulistano Christian Dunker sobre o conceito de “Cultura da Indiferença”. Segundo o estudioso, tal cultura se desenvolve no interior de uma sociedade normatizante, branca e heteronormativa que nega, por meio da indiferença, as diversidades individuais, erguendo barreiras para anular essas subjetividades. Assim, transformamos o nosso entorno em uma bolha de iguais e, portanto, narcisista, onde tudo que se quer ver em um mundo previsível é a si mesmo e não o outro.
O elenco da peça traz Adriane Hintze, Alef Barros, André Vilé, Dagoberto Macedo, Elisete Santos, Felipe Tercetto, Igor Mo, Juliane Maria e Vivian Valente. Os atores são acompanhados por um músico que, além de executar uma sonoplastia experimental ruidosa, toca ao vivo parte da trilha sonora composta por Nakagawa.
A canção brasileira é um forte traço da linguagem cênica do diretor e compositor, que já teve três de suas canções gravadas em álbuns de Ney Matogrosso. A última delas, “O Inominável”, foi composta para o último espetáculo de Nakagawa, “Normalopatas”.
Sinopse
A terceira peça escrita e dirigida por Dan Nakagawa é um “quase” musical com estética do Teatro do Absurdo. Uma babá cuida de Jean Lucca, filho de um casal morador de um luxuoso condomínio nos arredores de São Paulo, eles preparam uma festa de aniversário para o menino, que em nenhum momento é visto na peça; sua presença se faz pela constante ausência. A babá e as pessoas que vão chegando na casa da família parecem ameaçar a vida do casal anfitrião.
Complexo Cultural Funarte SP
O Aniversário de Jean Lucca, de Dan Nakagawa
Temporada: 11 de março a 2 de abril
Aos sábados, às 20h, e aos domingos, às 19h
Complexo Cultural Funarte SP – Alameda Nothmann, 1058, Campos Elíseos
Ingressos: R$30 (inteira) e R$15 (meia-entrada)
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